quarta-feira, 14 de julho de 2010

As loucuras da paixão

Stephen Fleming é um dos líderes do parlamento inglês, com reputação intocável e comportamento familiar exemplar. Isto até se apaixonar pela noiva do filho, Anna. Os dois começam um relacionamento, mas Anna não está disposta a abrir mão do noivo. Stephen então altera sua rotina para estar com ela em seus encontros furtivos. Eles sabem o quanto este relacionamento pode abalar as pessoas que amam e destruir suas vidas, mas a paixão é mais forte que a razão. O que acontece? Uma tragédia. Esta é a sinopse do filme Perdas e Danos, de Louis Malle, baseado na novela de Josephine Hart, com Jeremy Irons e Juliette Binoche nos papeis principais.


A paixão nos faz olhar o mundo de outra forma. Tudo assume cores e matizes surpreendentes. Êxtase, euforia, apreensão, dias inquietos, noites insones... É possível estar entre muitas pessoas e ficar preso por uma única imagem. Todos desaparecem, até a realidade se afasta do cenário e a pessoa amada se torna a única presença significativa, a única que nos importa. Vivemos numa espécie de “solidão a dois”. Uma dimensão minha, interna, de que eu não era consciente, emerge e eu me enriqueço com o que até aquele momento me era desconhecido.

A paixão pode ser comparada ao estado hipnótico. Há uma fixação no ser amado, o que em alguns casos se torna uma obsessão. Os amantes experimentam um sentimento de incrível plenitude e, simultaneamente, têm a impressão de terem vivido até aquele momento em estado de privação: a presença do outro é fonte de bem-estar que parece ter possibilidades inesgotáveis. É como se novas percepções e emoções enchessem os nossos canais sensoriais, abrindo à alma outra dimensão.

Isso porque a principal característica da paixão é a urgência. Ela é tão invasiva e poderosa que pode fazer com que sejam ignoradas todas as obrigações habituais. Perturba as relações cotidianas, arrancando a pessoa das atividades a que está acostumada, deixando-a completamente fora do ar. É comum se fazerem escolhas radicais e muitas vezes penosas — falta-se ao trabalho, larga-se o emprego, muda-se de cidade, abandona-se a família. “O amor é bem comportado, se faz no lugar da ordem. É exercido a partir de uma série de referências bem ordenadas. A paixão, não. Ela subverte, perverte, te vira pelo avesso. A paixão te coloca fora da lei. O amor é legal, tem futuro, faz promessas...”, acrescenta Garcia-Roza

O desejo e o sofrimento fazem com que todos se sintam vivos, proporcionando um frisson, e muitas surpresas. Necessita-se do outro, não como ele é no real, mas como instrumento que torna possível viver uma paixão ardente. Somos envolvidos por um sentimento tão intenso que por ele ansiamos, apesar de nos fazer sofrer. Os apaixonados não precisam da presença do outro, mas da sua ausência. Contudo, a maioria reconhece que a paixão acaba logo.

Vários estudos já mostraram que o violento distúrbio emocional causado pela paixão é desencadeado por algo físico que acontece no cérebro. Talvez aí se explique porque as pessoas apaixonadas são capazes de ficar acordadas a noite inteira, conversando ou fazendo sexo. Mas existem alguns pré-requisitos: certo distanciamento e mistério são essenciais para a paixão; em geral, as pessoas não se apaixonam por alguém que conhecem bem.

Segundo uma pesquisa sobre a natureza da paixão, feita recentemente nos Estados Unidos, em que foram entrevistadas cinco mil pessoas em 37 culturas, há uma série de evidências de que essa exaltação seja criada por um coquetel de substâncias químicas cerebrais e deflagrada pelo condicionamento cultural. Os pesquisadores observaram que esse tipo de emoção não dura mais que dois anos e meio, quando a pessoa começa a voltar a um estado mental relaxado. Em meados da década de 60 a psicóloga americana Doroty Tennov já havia chegado à conclusão de que a duração média de uma paixão é de 18 meses a três anos. Suspeita-se que seu término também se deva à fisiologia cerebral; o cérebro não suportaria manter eternamente essa excitação.

Mas a paixão está em via de extinção. As mentalidades estão mudando e a tendência é outra. A filósofa francesa Elisabeth Badinter acredita que agora homens e mulheres sonham com outra coisa diferente dos dilaceramentos. Se as promessas de sofrimento devem vencer os prazeres, preferimos nos desligar. Além disso, a permissividade tirou da paixão seu motor mais poderoso: a proibição. “Ao admitir que o coração não está mais fora da lei, mas acima dela, pregou-se uma peça no desejo”, diz ela. Então, mesmo que ainda quiséssemos, não poderíamos mais. As condições da paixão não estão mais reunidas, tanto do ponto de vista social quanto psicológico.

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